quarta-feira, 23 de julho de 2008

Mês que vem

Era de noites assim que eu falava. Ela não entendeu, falou pra que eu pedisse a conta. Meu mês morreu ali, bolachas e água da torneira, minha mãe reclamará do fato de eu estar cada vez mais magro. Ela ainda falou para irmos de táxi. Já vi tudo, terei que me desfazer de algumas coisas. Quem precisa de livros e relógio?

Ela dizia algumas coisas que eu não compreendia. O frio me doía até os ossos, precisarei comprar um agasalho melhor, aquele estava morto. Falou que saltaria na próxima rua. Saltou, andando desajeitadamente com seus saltos, a calçada ainda estava úmida, o reflexo dos faróis no asfalto era tão encantador quanto aquele sorriso de boa noite, nenhum beijo. Mas aqueles dentes me bastaram.

Desci na outra esquina, não podia me dar àquele luxo, dei os restos mortais do meu bolso para o taxista que fez cara feia por causa de dois e vinte. Não pude fazer nada. O jeito era caminhar. Pelo menos assim eu pude guardar a noite na cicatriz do machucado que ficou no meu pé. Sapatos gastos demais para andar longas distâncias. Ela não entenderia, aquele tipo de vida que levava não era pra mim. Me bastava um sanduíche barato, das mãos de um vendedor não muito higiênico, nenhum pouco refinado.

Ela não entenderia e eu teria que fingir de novo, mas só no próximo mês.

segunda-feira, 14 de julho de 2008

Estiagem

Longo período de seca que ocorre em algumas regiões do planeta. Em algumas pode até perdurar por anos.
Hoje eu me sinto a Nova Zelândia criativa, nada sai, nenhuma gota, nem ao menos esperanças remotas, apenas uma dor no corpo e a falta de alguma coisa que nunca me pertenceu.
Eu não sou dona de poemas ou palavras bonitas, minha única função é ficar até a chuva cair.
Quando?

quarta-feira, 18 de junho de 2008

Pra quê?

Já deixei de lado tudo o que não deveria estar aqui dentro, mas parece que a coisa persiste, está encravado. Dói-me só de vez em quando e incomoda profundamente. Tentei achar o motivo principal, porém me ocorre o medo de descobrir e perder toda a inspiração pobre que me resta.

Me vem a vontade de deixar de existir, mas penso em certas situações, em algumas pessoas e decido ficar com essa existência decadente. E, também, penso que acabar com tudo isso seria facilitar demais para mim.

Eu deixo tudo sem um final, prefiro.

quarta-feira, 4 de junho de 2008

Logo, logo

Alguns dias, vários quilômetros a se percorrer, finais de semana um pouco vazios, conexão lenta, dias bonitos aqui, chuvosos aí, ligações, frases apenas. Nomes de livros, sites bonitos, piadas infames, desenhos. Uma hora chega, uma hora tudo se encaixa.

Minha vontade é de fazer o mundo girar mais rápido, mas não tenho esse tipo de poder. Enquanto não desenvolver essa capacidade, só me resta sonhar com um abraço longo e apertado, com uma conversa ao pé do ouvido, com um “Chega de Saudade” pouco afinado.

Seus livros, filmes revirados por mim, pedacinhos meus espalhados por sua casa, cada gosto seu na minha boca e eu te esperando no portão depois do trabalho.

Não vou mentir, tenho pressa, mas sou calma, paciente. O dia vai chegar sem demora, no tempo que tem que ser, as 24 horas de cada dia que falta, passará como 24 horas de um dia normal.

E eu chego, com minha mochila nas costas, cheias de beijos estalados, abraços demorados. No bolso, coração acelerado. No rosto um sorriso capaz de te envolver. E na retina, sua imagem me espera. Finalmente!

sábado, 17 de maio de 2008

Ficou tão pequena

que já não cabia mais em si.

quarta-feira, 7 de maio de 2008

No Title

E engole, e cospe, e engole mais um pouco. O negócio é mastigar bem, até virar uma massa disforme, com uma cor de burro-quando-foge. O jeito é fazer parecer o que não é. Depois, misturar tudo outra vez e continuar sempre. Aí, você arruma um padrinho, uma influência e um cantinho ao lado do obituário. Em seguida, você passa por um tubo de imagem, fala com gordos burgueses para gordos burgueses que, no fim, irão engolir sem pensar tudo aquilo que já foi expelido pelos poros do grande mastigador.

quarta-feira, 16 de janeiro de 2008

Eu, você, nós dois

Estava eu lá, jogada na cama, olhando pro teto branco do meu quarto, enquanto no rádio tocava “Saudosismo”. Talvez fosse mais um domingo qualquer. Só sentia vontade de fazer nada. Vai ver era quarta-feira e eu nem me dei conta disso. Sim, devia ser quarta-feira de cinzas. Sentia como se tivesse dormido dois meses seguidos. Sempre odiei dormir demais, o corpo doía, a cabeça também. O tempo e o som...
Devia ser saudade ou falta do que fazer, fim de carreira. O carnaval tinha acabo e isso era uma certeza só minha. Um chiado de disco velho, não era rádio. Quem tinha vitrola? Quem tinha esse disco? Minha vontade de ver o sol continuava a mesma. Ficava no quarto olhando pro teto, com as cortinas fechadas, a luz entrava pelas frestas. A bossa, a fossa...
O telefone parara de tocar, foi aí que acho que acordei. Silêncio sepulcral, desafinado, des-afinado, som finado. Paciência zero, não queria ver rostos brancos e felizes. Tinha dormido mais do que o necessário, isso era fato. Por um momento preferia a insônia de sempre, mas até ela deixou carta de despedida. Só a inércia.
Eu não fazia questão de tomar uma atitude, de ser mais uma imbecil no meio de uma multidão de pessoas brilhantes. Creio que não se tratava de medo, mas preguiça. Até respirar tornava-se tarefa árdua, existir então.
Um passado deixado na porta do quarto, eu já nem me lembrava disso. Era norte demais pra mim. Tudo o que não queria, eu ganhava.