quinta-feira, 30 de agosto de 2007

Textos

Inacabados. É isso o que eu faço e é isso que me faz. Começo e deixo. Assim com tudo, como tudo. Enfim, chego ao fim antes que ele chegue no papel, completo em outro local e não em palavras gravadas em algo material.

Por vezes, minha mão trêmula não consegue acompanhar o ritmo alucinante das imagens que aparecem em frente aos meus olhos. Uma angústia toma conta de mim e não termino, prefiro que seja assim, é melhor. Sempre o nunca chega.

terça-feira, 28 de agosto de 2007

Agosto

É um mês difícil, mas já está no final. O que dá um certo alívio, porém gera um desespero, não sei bem o porquê.
Enquanto isso, as árvores queimam lá fora e o cheiro de fumaça me deixa um pouco entorpecida.

sexta-feira, 24 de agosto de 2007

Hoje

Me veio um conto, assim, como se não quisesse nada. Chegou bem de repente, como um dor de cabeça nos dias secos dessa cidade-deserto e como a dor, deu pequenos sinais, mas fingi não ver, não lhe dei olhos. Por isso que digo que foi de repente, apesar de não ter sido tão repentino assim. Falaram-me que tenho que escrever para me descarregar de certas dores, mas algumas delas são tão agudas que nem se eu escrevesse tudo o que já foi escrito e o que será escrito por futuros escritores fantasmas, eu conseguiria me livrar delas. Dor de reumatismo... vem quando esfria.

E aqui, na cidade-sem-água e sem profundidade, sempre faz frio, sempre. Então dói, sempre. Como se a dor fosse meu animal de estimação, vou cuidando até ela crescer e depois me afeiçoo e não consigo me livrar dela. É assim nos pequenos corações feridos, devem existir muitos por aí. E mesmo que eu não consiga me livrar de todas as dores, pois elas são necessárias para uma sobrevivência saudável, continuo escrevendo: em qualquer guardanapo, numa nota de um real, nas capas de livros rasgados, nos maços de cigarro, nos sachês de açúcar dos café que andam me consumindo. Escrevo nas mãos e nas pernas, tento escrever na nuca, mas gosto de ver o que eu digo, desisto, minha casa não tem espelhos e não confio nos leitores amigáveis.

Escrevi, mas não sei se um dia mostrarei para alguém. Acho que não, é pessoal demais, seria me desnudar ao extremo em frente a desconhecidos, mas, sem bem que, nessas ocasiões eu me mostro mais, pois não me incomodo muito com estranhos. Platéia pra quê? só falo para tirar o nó da garganta, só canto para vomitar um pouco e escrevo para me livrar desses pecados diários. Acho que é assim que funciona no mundo todo e em Saturno, pois acredito que naquele planeta encurralado entre anéis, as pessoas devem sofrer tanto quanto os que sofrem como eu e como qualquer outra pessoa que cativa a dor. Penso que lá deve haver pessoas sensíveis, mais do que aqui, porque já nos acostumamos com isso tudo e não nos importamos em ferir os outros. Vai ver que é isso...

Deixo-o amadurecer na gaveta, mas é bem possível que eu jogue no lixo antes que ele apodreça e comece a infestar a casa com seu cheiro adocicado dos clichês.

quarta-feira, 22 de agosto de 2007

Botões

Eu estava aqui pensando com os meus botões de carne e osso: preciso voltar a escrever. Escrever pra exorcizar os bons e os maus acontecimentos, botar tudo pra fora: paixões, desilusões, dores, mortes diárias, angústias, pequenas alegrias, tudo. O negócio é: o blog é um bom lugar pra isso?
Creio que não. É por isso que eu só coloco as trivialidades, não dá pra falar mais do que isso por aqui. Pra que? Pra quem? Enquanto ele ainda era secreto dava até pra confessar crimes. Mas mesmo com tudo isso, eu ainda gosto de gritar segredos por aqui, qualquer um, de qualquer tipo.

Hoje, senti uma vontade incrível de ler todos os livros que já foram escritos e em suas respectivas línguas, tudo no original, pra não perder detalhe algum. Essa é uma vontade constante, tenho sempre, pelo menos umas três vezes por mês. Acho que é pra ver o quanto eu sou incapaz de escrever, escrever coisas que toquem quem as lê, coisas que tenham algum sentido, ao menos para mim. Acho que é para sentir emoções que não são minhas, provavelmente. Cortázar falando dos botões andando pelas ruas, um arrepio, nunca conseguiria fazer alguém se sentir assim nem minha própria mãe.

Tem dias que eu acordo analfabeta e só tenho vontade de falar. E quero falar só de assuntos que eu desconheço, faz parte de mim. Algumas vezes, eu acordo muda e só escuto os problemas do mundo, para poder escutar os meus. Certos dias, eu nem me lembro meu nome, começo a agir diferente, quando olho no espelho, sou outra em uma época diferente, até meu perfume muda. E quando eu acordo, o sonho acaba e os problemas continuam junto com o perfume e com a vontade de ler todos os livros, não com os olhos, mas com a alma embebida em um sentimento bonito.

Quem sabe?

sexta-feira, 17 de agosto de 2007

Como?

Como as pessoas dizem que não gostam de rotina? Pra mim é o melhor remédio, sempre. Eu sou dependente de rotina, é bem mais seguro e eu não tenho coragem de ficar me arriscando por aí. Nada de pular de pára-quedas, viajar pra África, subir o morro durante a noite, essas coisas mais arriscadas, sabe? Não sou do tipo que gosta de aventuras.
Eu sou antiquada mesmo, e daí?

sexta-feira, 10 de agosto de 2007

Someday, someday...

Tava aqui pensando, sempre que eu acho que o mundo vai acabar, ele me decepciona.

terça-feira, 7 de agosto de 2007

No se puede...

Hoje me deparei com um conto mais do que bonito do Caio F., meu companheiro de todas as horas. Ele está no livro "Ovelhas Negras", o título é "Metâmeros", dividido em duas partes, mas só transcreverei a segunda parte. Eis a explicação da palavra metâmeros, dada pelo próprio Caio:

"Desde que li em algum livro de biologia que 'metâmero é cada um dos anéis do corpo de um verme, e que cada um desses metâmeros pode formar um verme novo', fiquei fascinado pela idéia de textos que seriam assim como embriões de si mesmos. Se desenvolvidos, poderiam resultar em contos ou até mesmo novelas ou romances. Das dezenas que escrevi, estes dois me parecem os melhores"

Ok, não publicarei o primeiro, não hoje, a vontade não veio, mas a vontade de vomitar o segundo é maior do que eu.

II. SOBRE O VULCÃO
No se puede vivir sin amor.
(Malcolm Lowry: Under the Volcano)
Naquele tempo, minha única ocupação diária era tentar não morrer. Talvez pareça excessivamente dramático dito assim, mas assim era. Nem sinistra ou espantosa, apenas cotidiana feito xícara de café, janela aberta ou fechada sobre esse espaço vago que chamam de o depois, dentro e fora de mim, a morte estava sempre presente.
Naqueles dias uterinos, gordurosos, naqueles dias amnióticos quando eu não conseguia sequer sair da cama, trinta horas em posição fetal sem dormir nem viver, numa espécie de ensaio geral da treva definitiva deflagrada pela hospitalização de Daniel, pouco mais de quarenta quilos e nódulos púrpuras espalhados pelo novo corpo quase de criança onde, do antigo, restavam apenas os enormes olhos verdes, e também pelo suicídio de Julia, pulsos cortados e a cabeça enfiada no forno do fogão a gás, vestida de bailarina com tutu de gaze azul e sapatilhas, depois de ter grafitado em spray rosa-choque no lado de fora da cozinha alguma coisa em espanhol, alguma coisa amarga, alguma coisa assim: no se puede vivir sin amor.
Daquele tempo nem tão distante, daqueles dias que até hoje duram às vezes duas, às vezes duzentas horas, restou essa sensação de que, como eles, também me vou tombando rápido dentro da boca de um vulcão aberto sem fôlego nem tempo para repetir como numa justificativa, ou oração, ou mantra, enquanto caio sem salvação no fogo que é verdade, que si, que no, que nadie puede mismo vivir sin amor.

domingo, 5 de agosto de 2007

Tem coisas

como o poema abaixo, que eu gostaria de ter escrito.

E ele, sim, me faz pensar em alguém, alguém muito distante, praticamente de outra dimensão, que vive num pedestal, lá, intocável, inalcançável, lá longe. Muito longe, onde toda beleza do mundo se esconde.

Antes assim.

Foi assim

que eu conheci E. E. Cummings

O Poema - e. e. cummings

nalgum lugar em que eu nunca estive, alegremente além
de qualquer experiência, teus olhos têm o seu silêncio:
no teu gesto mais frágil há coisas que me encerram,
ou que eu não ouso tocar porque estão demasiado perto

teu mais ligeiro olhar facilmente me descerra
embora eu tenha me fechado como dedos, nalgum lugar
me abres sempre pétala por pétala como a Primavera abre
(tocando sutilmente, misteriosamente) a sua primeira rosa

ou se quiseres me ver fechado, eu e
minha vida nos fecharemos belamente, de repente,
assim como o coração desta flor imagina
a neve cuidadosamente descendo em toda a parte;

nada que eu possa perceber neste universo iguala
o poder de tua imensa fragilidade:
cuja texturacompele-me com a cor de seus continentes,
restituindo a morte e o sempre cada vez que respira

(não sei dizer o que há em ti que fecha
e abre; só uma parte de mim compreende que a
voz dos teus olhos é mais profunda que todas as rosas)
ninguém, nem mesmo a chuva,
tem mãos tão pequenas

(tradução: Augusto de Campos)

sexta-feira, 3 de agosto de 2007

America

"America I've given you all and now I'm nothing.
America two dollars and twenty-seven cents January 17, 1956.
I can't stand my own mind.
America when will we end the human war?
Go fuck yourself with your atom bomb
I don't feel good don't bother me.
I won't write my poem till I'm in my right mind
America when will you be angelic?
When will you take off your clothes?
When will you look at yourself through the grave?
When will you be worthy of your million Trotskyites?
America why are your libraries full of tears?
America when will you send your eggs to India?
I'm sick of your insane demands.
When can I go into the supermarket and buy what
I need with my good looks?
America after all it is you and I who are perfect not the next world.
Your machinery is too much for me.
You made me want to be a saint.
There must be some other way to settle this argument.
Burroughs is in Tangiers I don't think he'll come back it's sinister.
Are you being sinister or is this some form of practical joke?
I'm trying to come to the point. I refuse to give up my obsession.
America stop pushing I know what I'm doing.
America the plum blossoms are falling.
I haven't read the newspapers for months, everyday somebody goes on trial for murder.
America I feel sentimental about the Wobblies.
America I used to be a communist when I was a kid and I'm not sorry.
I smoke marijuana every chance I get.
I sit in my house for days on end and stare at the roses in the closet.
When I go to Chinatown I get drunk and never get laid.
My mind is made up there's going to be trouble.
You should have seen me reading Marx.
My psychoanalyst thinks I'm perfectly right.
I won't say the Lord's Prayer.
I have mystical visions and cosmic vibrations.
America I still haven't told you what you did to Uncle Max after he came over
from Russia.

I'm addressing you.
Are you going to let our emotional life be run by Time Magazine?
I'm obsessed by Time Magazine.
I read it every week.
Its cover stares at me every time I slink past the corner candystore.
I read it in the basement of the Berkeley Public Library.
It's always telling me about responsibility.
Businessmen are serious.
Movie producers are serious.
Everybody's serious but me.
It occurs to me that I am America.
I am talking to myself again.

Asia is rising against me.
I haven't got a chinaman's chance.
I'd better consider my national resources.
My national resources consist of two joints of marijuana millions of genitals
an unpublishable private literature that goes 1400 miles and hour and
twentyfivethousand mental institutions.
I say nothing about my prisons nor the millions of underpriviliged who live in
my flowerpots under the light of five hundred suns.
I have abolished the whorehouses of France, Tangiers is the next to go.
My ambition is to be President despite the fact that I'm a Catholic.

America how can I write a holy litany in your silly mood?
I will continue like Henry Ford my strophes are as individual as his
automobiles more so they're all different sexes
America I will sell you strophes $2500 apiece $500 down on your old strophe
America free Tom Mooney
America save the Spanish Loyalists
America Sacco & Vanzetti must not die
America I am the Scottsboro boys
America when I was seven momma took me to Communist Cell meetings they
sold us garbanzos a handful per ticket a ticket costs a nickel and the
speeches were free everybody was angelic and sentimental about the
workers it was all so sincere you have no idea what a good thing the party
was in 1935 Scott Nearing was a grand old man a real mensch Mother
Bloor made me cry I once saw Israel Amter plain. Everybody must have
been a spy.
America you don're really want to go to war.
America it's them bad Russians.
Them Russians them Russians and them Chinamen. And them Russians.
The Russia wants to eat us alive. The Russia's power mad. She wants to take
our cars from out our garages.
Her wants to grab Chicago. Her needs a Red Reader's Digest. her wants our
auto plants in Siberia. Him big bureaucracy running our fillingstations.
That no good. Ugh. Him makes Indians learn read. Him need big black niggers.
Hah. Her make us all work sixteen hours a day. Help.
America this is quite serious.
America this is the impression I get from looking in the television set.
America is this correct?
I'd better get right down to the job.
It's true I don't want to join the Army or turn lathes in precision parts
factories, I'm nearsighted and psychopathic anyway.
America I'm putting my queer shoulder to the wheel."

(Allen Ginsberg)

Me lembrei

que gosto bastante de um texto do Allen Ginsberg, acho que o título é "América" ou algo parecido ou nada parecido com isso. Fala do egoísmo americano e nada como um americano reclamando do próprio país, esses eu respeito. Qualquer um reclamar dos EUA é fácil, mas um nativo... é raro.